O Português é uma língua derivada dos dialectos latinos, românicos peninsulares ou simplesmente romance, que resultaram da mistura do latim vulgar, falado pelos soldados romanos, com os dialectos locais existentes na Península Ibérica à data da sua ocupação.
O Português sofre inevitavelmente a influência da Língua Árabe durante o período Islâmico.
É não só muito influenciada pelos dialectos moçárabes falados no Sul da Lusitânia, que absorvem inúmeras palavras Árabes, como posteriormente pelos mudéjares que adoptam o romance como sua língua.
Apesar dos mais de 500 anos que durou a presença Árabe em Portugal essa influência refere-se essencialmente aos substantivos, pelo que não podemos falar de uma influência estrutural ou gramatical.
Em termos de não substantivos absorvidos pelo português refiro o advérbio Até, os adjectivos Mesquinho e Azul, o pronome indefinido Fulano e três interjeições _ Arre!, Rua! e Oxalá.
Os substantivos, que a generalidade dos autores apontam para um número de cerca de 1.000, apresentam características fonéticas particulares.
O Salão Árabe do Palácio da Bolsa do Porto
A grande maioria dos substantivos começa com o artigo definido Al (o ou a), muitas vezes com o l assimilado à consoante inicial do substantivo, concretamente quando esta é uma consoante solar.
No alfabeto Árabe não existem vogais, mas apenas consoantes, e as consoantes dividem-se em consoantes lunares e consoantes solares.
As consoantes lunares não têm influência na pronúncia do l do artigo Al, quando constituem a letra inicial da palavra, como por exemplo em Alferes (o cavaleiro), Almeida (a mesa) ou Alcântara (a ponte).
Mas as consoante solares quando colocadas na mesma posição assimilam o l do artigo Al, duplicando o seu valor.
Por exemplo Azeite escreve-se Alzeite em Árabe, mas pronuncia-se Azzeite pelo facto de o z ser uma consoante solar.
Daí a origem de termos como Azulejo, Açorda ou Atalaia.
Outras formas comuns de início de termos de origem Árabe são as palavras que começam por x (Xadrez, Xarope ou Xerife) ou por enx (Enxaqueca, Enxoval ou Enxofre).
Outras palavras são caracterizadas pela terminação, como as que terminam em i (Javali, Mufti ou Sufi), em il (Cordovil, Mandil ou Anil), em im (Alecrim, Carmesim ou Cetim) e as terminadas em afe ou aque (Alcadafe, Almanaque ou Atabeque).
Algumas consoantes Árabes não entram nos vocábulos portugueses por uma questão de não se adaptarem à forma de pronunciar do português, como o h que geralmente se transforma em f, como em Alfama (do Árabe Alhammam), Alfazema (do Árabe Alhuzaima) ou Alface (do Árabe Alhassa).
“Volta do Mercado Saloio” de Roque Gameiro
Saloio vem do Árabe Sahraui, ou habitante do deserto
Os substantivos podem ser agrupados em várias categorias, maioritariamente relativas a inovações ou contributos que os Árabes introduziram na nossa sociedade, e a topónimos, que se observam de Norte a Sul do País e que muitas vezes aportam informações sobre o passado das próprias localidades.
No primeiro caso refiram-se as designações de cargos públicos (Alcaide, Almoxarife ou Alferes), termos de tipologias de edificações (Alcácer, Alcáçova ou Aljube), de construção (Alvenaria, Azulejo ou Açoteia), de instituições administrativas (Aldeia, Arrabalde ou Alfândega), de plantas (Arroz, Alfazema ou Alfarroba), de frutos (Tâmara, Romã ou Ameixa), de profissões (Alfaiate, Almocreve ou Alfaqueque), de termos relacionados com a agricultura (Enxada, Alcatruz ou Azenha), com a actividade militar (Adaga, Arsenal ou Arrebate), de termos médicos (Xarope, Enxaqueca ou Chá), de termos geográficos (Azinhaga, Lezíria ou Albufeira), de unidades de medida (Alqueire, Arroba ou Arrátel), de animais (Alcatraz, Lacrau ou Javali), de adereços (Alfinete, Almofada ou Alcatifa), de instrumentos musicais (Adufe, Alaúde ou Rabeca), de produtos agrícolas e industriais (Azeite, Álcool ou Alcatrão), das ciências exactas (Álgebra, Algarismo ou Cifra).
No caso dos topónimos, para além da grande maioria de termos iniciados pelo artigo Al ou pela sua forma com o l assimilado, existem outros com origem comum, que podemos agrupar.
Por exemplo, os topónimos iniciados por Ode (do Árabe Ued ou Rio), como Odemira, Odeceixe ou Odeleite.
Os iniciados por Ben (em Árabe Ben ou Ibn significa Filho, mas em toponímia tem o significado de Lugar), como Bensafrim, Benfarras ou Benamor.
A título de curiosidade refiram-se alguns topónimos de origem Árabe com indicação do seu significado:
Albarraque (Albarrak, ou o brilhante), Albufeira (Albuhaira, ou a pequena barragem), Alcácer (Alqassr, ou o castelo), Alcáçovas (Alqassba, ou a cidadela fortificada), Alcaidaria (a chefia), Alcaide (o chefe), Alcains (Alkanissa, ou a igreja), Alcântara (a ponte), Alcantarilha (diminutivo de Alcântara), Alcaria (a aldeia), Alcobaça (Alkubasha, ou os carneiros), Alcochete (Alqucha, ou o forno), Alcoentre (Alqunaitara, ou a ponte pequena), Alfama (Alhammam, ou os banhos), Alfambras (Alhamra, ou a vermelha), Alfarim (Alfarish, ou corte de floresta, no sentido de industria madeireira), Alfarrobeira (Alharruba, o mesmo que em português), Alferce (a picareta), Algarve (Algharb, ou o Ocidente), Algeruz (o canal), Algés (Aljaich, ou o exército), Algueirão (Aljairan, ou as grutas), Alhandra (Alhammam, ou os banhos), Aljezur (Aljazair, ou as ilhas), Almacave (Almaqabara, ou os cemitérios), Almada (Almadin, ou a mina), Almansil (a estalagem), Almargem (Almarjan, ou o prado), Almedina (a cidade), Almoçageme (Almassjid, ou a mesquita), Almodôvar (Almudura, ou o cercado redondo), Alqueidão (Alhaima, ou a tenda), Alvaiázere (Albaiaz, ou o falcoeiro), Alvalade (Albalad, ou o campo), Alverca (Albirka, ou o pântano), Alvor (Albir, ou o poço), Alvorge (Alburj, ou a torre), Arrábida (lugar de oração), Asseca (caminho recto e plano), Atalaia (lugar alto de onde se exerce vigilância), Azambuja (o zambujeiro), Azeitão (zona de produção de azeite), Azóia (Azauia, ou lugar de oração), Bensafrim (Ben Safarin, ou lugar dos feiticeiros), Bobadela (Bu abdallah, ou filho do escravo de Deus), Boliqueime (Bu Alhakim, nome próprio), Cacém (nome próprio, que significa aquele que testemunha), Caneças (Kanissa, ou igreja), Cuba (pequena torre), Faro (Harun, nome próprio), Fátima (nome da filha do Profeta Muhammad), Loulé (Al’ulia, ou a alta), Mafamude (Mahmmud, nome do Profeta), Mafra (Mahfra, ou cova), Malhada (lugar de travessia de um rio), Marvão (Marwan, nome próprio), Massamá (Maktamá, ou nascente de água), Mesquita (Massjid, o mesmo que em português), Messejana (prisão), Odemira (Ued Amira, ou rio da princesa), Palmela (Bismillah, ou em nome de Deus), Queluz (vale da amendoeira), Safara (Sahara, ou deserta), Salema (Salama, ou paz).
Bibliografia
Conde, Manuel Sílvio Alves . Ocupação Humana e Polarização de um Espaço Rural do Gharb Al-Andalus . O Médio Tejo à Luz da Toponímia Arábica
Cunha, António Geraldo . Dicionário Etimológico
Fernandes, Maria Alice . Khawli, Abdallah . Fraga da Silva, Luís . A Viagem de Ibn ‘Ammar de S. Brás a Silves
Ribeiro, Carlos Leite . Distritos e Concelhos de Portugal
Silva, José Pereira . Contribuição Árabe na Formação do Português
...de aventar.
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário